Por muito tempo, se falou na mídia como um quarto poder. Junto com os três poderes (legislativo, executivo e judiciário), a mídia apareceria como um poder adicional. Quando falo em mídia, nesse contexto, me refiro à chamada mídia tradicional, como a TV e o rádio. As mídias sociais, como Instagram e WhatsApp, sendo mais recentes, não entrariam.
E por que a mídia era colocada como um quarto poder? Muito se deve, principalmente, à capacidade de influenciar as pessoas, tanto politicamente, quanto economicamente, dentre outras coisas. A questão aqui não é negar por absoluto a influência que a mídia tradicional ainda exerce e/ou pode exercer nos indivíduos. Logicamente, tal questão ainda é muito válida. Mas, nos últimos anos, presenciamos um aumento significativo no uso de mídias sociais, como Instagram, Telegram, X (antigo Twitter), dentre outros.
Dentro destas mídias, várias pessoas estão comentando sobre variados temas e, a política partidária, não escapa de tal atrocidade. Cientistas políticos formados no WhatsApp, jovens de 15 anos especialistas em economia, pessoas que se formam pelo grupo da família no “zap zap”, são algumas tragédias que acompanhamos nas mídias sociais.
E como tais questões podem favorecer um determinado espectro político em detrimento de outro? Infelizmente, no último dia 20, o abusador sexual Donald Trump tomou posse como 47.º presidente daquele país imperialista e sanguinário da América do Norte. Um dos destaques na campanha de Trump, como bem observou o cientista brasileiro Miguel Nicolelis, em entrevista à TV GGN, foi a distorção entre o real e o que estava sendo propagado nas redes sociais. Dentre os países do G7, os Estados Unidos foram a melhor economia ao sair da pandemia, mas o que se propagou nas mídias sociais foi exatamente o contrário. Comentários propagaram mentiras falsas e absurdas, dizendo que a economia estadunidense estava um fiasco. Vizinhos de Nicolelis, como ele mesmo citou, diziam que a situação estava ruim, o preço das mercadorias aumentando, mas o que se via, na realidade, era o contrário. Menores preços nos supermercados em relação à época de Trump, aumento do fundo de pensão e recuperação econômica, um enorme fiasco com o sucessor de Joe Biden, não batiam com o que estava sendo propagado nas mídias sociais. Impressionantemente, o número de afro-americanos que votaram em Trump aumentou, assim como votantes latinos. Curiosamente, do lado democrata, estava concorrendo à presidência a primeira mulher afro-americana, o que deixa tal aspecto ainda mais impressionante.
A mobilização dos trabalhadores, em um contexto neoliberal, fica cada vez mais difícil. Em Modernidade Líquida, Zygmunt Bauman reserva algumas páginas para comentar especificamente sobre a questão do trabalho. Para o autor, dentro de um panorama recheado de incertezas, onde o trabalhador pode a qualquer momento perder o emprego, diante da política de corte de gastos e mão de obra do modelo neoliberal, a mobilização fica prejudicada. Lutar por algo que amanhã pode mais não ser, é muito complicado, é algo muito a curto prazo. Fora isso, muitos trabalhadores já estão em condições bem precárias, recebendo somente o necessário para sobrevivência no modo de produção capitalista, como bem colocou Karl Marx. Se envolver em uma causa e correr o risco de perder um emprego, onde a quantia paga é necessária apenas para a sobrevivência, é de extrema delicadeza. Sem contar os movimentos pós-modernos, de reinvindicações identitárias, que ao serem muito concentrados em um grupo menor, reivindicam questões específicas, confundindo a mobilização geral dos trabalhadores. Aqui, não invalido ou critico os movimentos identitários. Acredito que são frutos da individualização presentes no contexto do neoliberalismo.
Diante das dificuldades de mobilização postas acima, creio que as redes sociais, apesar de achar que favorecem a extrema direita, pode ser usada pela esquerda. Lutar contra o tempo que estamos seria errôneo, pois, como diria Guy Debord, não há nada que melhor definem os homens do que o tempo em que eles vivem. Em tais redes, o debate, geralmente, é muito vago e supérfluo. Mensagens rápidas, simples, superficiais, conseguem amalgamar variadas pessoas e, diante disso, o debate profundo fica escasso. A questão é que enquanto nas universidades é debatido a atualidade de György Lukács, por exemplo, a extrema direita se aproveita de um discurso raso e consegue trazer, para o seu lado, variadas pessoas. Não estou dizendo aqui, que discutir sobre Lukács ou qualquer outro intelectual não seja importante, pelo contrário, é fundamental. E não estou dizendo também, de forma alguma, que a esquerda precisa propagar um discurso mais raso e imbecilizado, como a extrema direita consegue fazer muito bem. É necessário comunicar melhor nas mídias sociais e aproveitar a influência que elas exercem na população. Não tenho uma resposta pronta, mas acredito que será necessária muita didática e saber traduzir debates complexos em questões mais “simples”.