Olá meus queridos leitores. Esse autor quem vós fala esta muito feliz porque esse blogzinho completou agora em Julho 3 anos de existência. Escrever me põe em contato com mais pessoas, me ajuda organizar as ideias e ate mesmo desabafar. Nunca imaginei que teria um publico tão cativo e que gostasse de compartilhar as reflexões do dia a dia.
O post de hoje começou de um presente que minha filha ganhou.
Minha filha ganhou um presente de uma prima minha. É uma pelúcia de um polvo que é duas em um. De um lado o polvo esta sorridente, e se você inverter o polvo pro outro lado ele fica ranzinza. Ai minha prima falou para minha filha que o polvo ranzinza era igual a mim, e minha filha disse que não, que eu era o polvo alegre. E isso me deixou pensativo mas afinal qual dos dois Fernandos eu sou realmente? o Ranzinza ou o Alegre? O titulo do post de hoje Nosce-te ipsum vem do latim “conhece te a ti mesmo.”
Nós como seres sociais nos comportamos diferentemente em cada ocasião o nosso Eu(a nossa identidade individual que temos de nós mesmos) é formado através da visão do outro sobre nós, isso remete ao conceito de um Psicanalista Francês famoso Jacques Lacan (1901-1981) Lacan criou o conceito de Estádio de espelhos. Esse conceito se refere ao período em que o bebê começa a se identificar como um indivíduo e se diferenciar dos outros. Ate esse ponto o bebê não sabe se identificar no mundo. É essa diferenciação se dá através da comparação com a mãe, e então a criança através dos olhos e dos juízos de valor da mãe e do pai cria então sua auto imagem que vai sendo constantemente alimentada pelo outro.
Nós estamos constantemente nos espelhando no que os outros dizem que sobre nós. Desta forma nos acreditamos no que é dito e reforçamos aquela característica ou comportamento; mesmo que inicialmente não fôssemos dessa maneira. No meu caso por um ambiente especifico eu me tornei uma pessoa chata, e ranzinza e critica em excesso. Comecei acreditar nisso por um bom tempo. Ate que um dia um Professor meu disse exatamente isso em sala de aula: ” as vezes as pessoas falam algo de nós e nós não somos aquilo, mas acreditamos nisso e introjetamos de tal forma que a gente passa a se comportar dessa maneira.”
Me lembro que quando eu cursei o curso de História, na sala em geral eu era muito focado, e era bastante critico quanto a atuação dos meus colegas e o comprometimento deles. Eu acreditava que todos tínhamos que dar o melhor de nós academicamente para assim aumentarmos nosso nível, mas a maioria dos meus colegas não fazia questão nenhuma disso, alguns estavam ali só para pegar o diploma, se aprendessem algo era lucro. Então eu estava atrapalhando eles, enchendo o saco deles a pegar o diploma do curso em paz. Então quando fui na primeira festa da sala as pessoas se surpreenderam comigo, elas pensavam que o mesmo Fernando critico e ranzinza da sala de aula seria o que estaria na festa. Para a surpresa deles eu estava totalmente alegre, bebendo me divertindo, cantando, jogando truco, conversando com todos e contando piadas. Eu não estava mudando meu comportamento para ser mais agradável nem nada, eu apenas estava em um contexto diferente, relaxado e bem humorado, coisa que dificilmente eu ficava na sala de aula.
Nós somos moldados o tempo todo pelas expectativas de terceiros, seja nossa família, seja a sociedade. Nossa imagem que temos de nós mesmos, nossa posição no mundo é sedimentada por fragmentos de diferentes lugares criando assim um mosaico imperfeito de nós. Como podemos então superar um Eu virtual que não escolhemos para nós mesmos? Para responder essa pergunta eu vou precisar recorrer a uma animação fantástica recente.
Kung fu Panda é uma animação produzida pela Dreamworks em 2008. O filme conta a história do de um protagonista o panda gigante o Po em sua jornada de autoconhecimento para se tonar o dragão guerreiro. No inicio do filme Po é um panda desajeitado que idolatra os cinco furiosos_ conhecidos por serem Mestres do Kung Fu eles são representados pelos 5 animais que representam estilos diferentes da arte marcial -Tigresa, Macaco, Garça, Víbora e Louva-a-Deus. Incapaz de seguir seu sonho de treinar Kung fu porque ajuda seu pai adotivo o Ganso no quiosque de macarrão. O sr Ganso tem planos para o filho para que ele continue a servir seu lendário macarrão, mas nosso herói tem sua própria jornada a trilhar. Chegando atrasado para ver a escolha do dragão guerreiro, Po se prende a uma carroça de fogos de artifício e se lança na arena. Ao cair bem na hora que o grão Mestre Oogway apontava para ele, Po e todos da arena descobrem perplexos que ele estava destinado a ser o grande Dragão Guerreiro.
Po começa seu treinamento, desacreditado pelos colegas e humilhado por shifu seu mestre, Po persevera no seu sonho de aprender kung fu, mas a virada da história acontece quando Oogway em seus momentos finais faz Shifu seu discípulo acreditar no potencial de Po, e ele então o faz prometer que irá treina-lo para assim se tornar o dragão Guerreiro. Quando seu Mestre Shifu muda sua postura em relação ao discípulo Po, num dos diálogos mais significativos do filme, ele pergunta para o panda porque mesmo sendo humilhado inicialmente , ele não foi embora. Po responde uma frase que para uma criança pode passar batido, para um adulto que cresceu sofrendo imposições da sociedade, que lida com frustrações e com o estresse do dia a dia desce rasgando:” sempre que o senhor me jogava alguma coisa, ou me dizia que eu fedia me magoava. Só não me magoava mais do que ser eu mesmo cada dia da minha vida.”
Nós somos bombardeados de expectativas o tempo todo, as pessoas nos dizem o que podemos ou não fazer. Nos rotulam e classificam como incapazes , como vou poder lutar contra um algo que esta fora de mim, algo que independe da minha vontade ? Para muitos só resta então aceitar aquilo e abraçar essa imagem criada pelos outros. O desfecho do filme mostra que, Po descobre que não há ingrediente secreto que o faça superar as expectativas criadas sobre nós _ e só quando descobrimos quem somos de verdade_ quando nos aceitamos, é que podemos enfim ficar blindados pelas expectativas de terceiros e assim despertar nosso verdadeiro potencial.
Eu abracei por muito tempo uma imagem exacerbada que não é minha, de uma pessoa ranzinza, critica e parecida com o Egon do Ratatouille. Eu comecei a reforçar esse comportamento, e quanto mais eu reforçava mais as pessoas me devolviam me achavam chato , critico, ácido e ranzinza. Afinal se todos vão me achar chato sem nem me conhecerem direito não tem porque eu tentar fugir disso não é mesmo?!
Mas as pessoas não me conhecem de verdade, elas só conhecem um pequeno pedaço de mim. E então assim como Po em Kung fu panda , eu descobri que não havia um ingrediente secreto, e meu pergaminho do Dragão Guerreiro me mostrou a verdade: meus filhos! Meus filhos me amam, eles me respeitam, eles querem minha companhia, eles sorriem e correm ao meu encontro quando chego em casa assobiando, e fazem o mesmo quando vou busca-los na escola. Não há nada mais cristalino do que um espelho desses, nada pode me motivar mais do que isso. É assim descobrindo que não há ingrediente secreto que nos torne especiais, e sendo quem nós somos é que podemos ser mais felizes conosco e evitar ser apenas um reflexo da vontade alheia!