Notas do Autor
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Olá, meus queridos Rabbiters! Como vão vocês? Curtindo o friozinho? Confesso que amo o inverno no Brasil! É a única época do ano em que o clima é ameno e não se soa igual à tampa de chaleira após sair do banho. Além de que é claro, comemoram-se as festas juninas/julinas com quermesses, a festa mais típica do Brasil, cheia de encantos com junção da cultura caipira com o sertanejo do nordeste! É uma festa que une o sagrado e o profano, que tem a canjica e o quentão, a quadrilha, a fogueira de São João, e mesmo que você não seja um católico ardente, pode aproveitar dessa festa tão tradicional e carregada de cultura maravilhosa do nosso Brasilzão!
Esse mês de julho completa-se um ano que não escrevo nesse bloguinho, e tenho andado um pouco ocupado, mas não sem ideias. As ideias permeiam desde o ano passado, a questão é que as colocar no papel tem se provado um processo difícil para mim. Parece que escrever depois da pandemia virou uma obrigação, e não consigo mais manter o ritmo de escrita que eu tinha.
Eu li esses dias uma coluna na Folha de São Paulo sobre o sentimento de fracasso e frustração dos Millenials essa geração que nasceu de 1981 a 1996. Eu, como parte dos Millenials me identifiquei na hora. A maioria das pessoas que conheço nessa idade tem se sentido sobrecarregadas e principalmente frustradas por não estarem dentro das próprias expectativas e da sociedade. Fomos criados com a promessa de sucesso e de impactar o mundo! Carreiras de sucesso, postos de liderança, viagens e intercâmbios, o mundo na palma das nossas mãos quando atingíssemos os 30! O filme De repente 30 feito em 2004 (13 going 30 no original) mostra muito isso!
Somos levados a promessa de status, de vida feita, como se o sucesso ou o sentido da vida pudesse ser medido em metas para todos. Então nessa crise de meia idade que nós Milenials atingimos diante do cansaço, burnout e da complexidade que o sistema nos impõe, eu resolvi começar do básico, será que temos mesmo que abraçar essas metas que a sociedade nos impõe?
Eu quero junto de você fazer uma reflexão por meio de uma animação maravilhosa, o filme da DreamWorks Gato de Botas 2. Então, prepare-se porque para falarmos disso, vai ter que ter spoilers. Caso não se incomode com isso, pegue sua pipoquinha junina, seu quentãozim e se aprume na sua cadeira que nóis vai cumeça esse trem!🤠🌽🔥
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O Herói mais destemido da Dreamworks
Olha, eu acho que poucas animações modernas conseguem falar sobre a morte de uma forma tão bonita e corajosa quanto Gato de Botas 2: O Último Pedido (2022). Esse filme da DreamWorks vai além das animações familiares que estamos acostumados, trazendo à luz um tema profundo: como lidamos com a nossa finitude e o que fazemos com o tempo que nos resta.
Mais do que só uma sequência do mundo de Shrek, Gato de Botas 2 brilha por como a história é contada, por seu visual que mistura 3D e 2D, lembrando um pouco Aranhaverso, e pelos personagens que enfrentam dilemas realmente tocantes.
Viver para o quê?
Vivemos em um tempo que ensina a correr. Correr atrás de prestígio, aplausos, curtidas, status. Só que no meio dessa pressa toda, muita gente simplesmente esquece de viver. E isso não é só modo de dizer. Basta observar ao redor: pessoas no automático, cumprindo tarefas que nem sempre escolheram, seguindo caminhos já traçados, como se a vida fosse uma sequência de metas vazias.

No meio disso tudo, aparece uma animação que, a princípio, parecia mais uma aventura divertida. Gato de Botas 2: O Último Pedido chegou sorrateiro, mas trouxe um peso existencial que poucos filmes “sérios” têm coragem de carregar. Entre espadas, piadas e perseguições, há algo ali que cutuca: será que estamos realmente vivendo?
Logo no começo do filme, o Gato é o que todo mundo quer ser: famoso, destemido, idolatrado. Ele é uma lenda. Mas, aos poucos, sua imagem se desfaz. Por trás da lenda, existe um personagem desconectado, que vive para manter uma aparência. É tudo fachada. E a gente também faz isso. Criamos versões de nós mesmos para os outros verem. Moldamos atitudes, opiniões e até sonhos para caber nos moldes do que é “aceitável” ou “admirável”.

O problema é que isso nos afasta daquilo que é mais real. Heidegger falava sobre essa existência inautêntica, onde evitamos olhar para dentro e escolhemos viver de acordo com o que esperam de nós. No fundo, é medo. Medo de assumir quem somos. Medo de sermos realmente livres, porque a liberdade, quando é de verdade, vem com responsabilidade, e com um preço a se pagar.
A virada no filme acontece quando o Gato encontra a Morte. Na figura do Lobo mau(Big Bad Wolf) ele é literalmente a morte. Ele surge como uma presença constante, imponente, e pela primeira vez o Gato treme. E é aí que a coisa muda. O Lobo não vem como um vilão, mas como lembrete. Ele mostra que o tempo está passando, que as vidas estão acabando, que não há como fugir de si mesmo para sempre.

Esse encontro o obriga a parar, pensar, sentir. E é nesse espaço de fragilidade que ele começa a se transformar. Nietzsche dizia que quando os valores antigos perdem o sentido, surge um vazio. Mas esse vazio também pode ser fértil. Dá pra recriar. Dá pra reinventar. O Gato começa a trocar a vaidade pela escuta, o ego pela companhia, o palco pela partilha.
O mais bonito é que o filme não faz isso de forma forçada. Não há redenção épica, nem discursos prontos. A mudança vem no gesto simples: dividir um pedaço de pão, confiar em alguém, sentar ao lado do amigo e simplesmente respirar. São nesses pequenos instantes que ele encontra paz. E não a paz de quem venceu algo, mas de quem finalmente parou de brigar com a própria imagem.
A grande mensagem talvez seja essa: não é preciso uma vida grandiosa cheia de metas e de sucesso para ter uma vida com sentido. A obra nos lembra que há algo profundamente libertador em desacelerar. Em escolher o afeto ao invés da aparência. Em aceitar que a vida é frágil, e por isso mesmo, preciosa.

O último pedido não precisa ser necessariamente mais tempo para se viver. Talvez só precise ser presença. Porque, no fim das contas, viver de verdade não é deixar um grande legado, mas é conseguir estar aqui!
Essa lição aparece com força naquele que, sem exagero , é o personagem mais sábio do filme: Perrito. Simples, otimista e companheiro. Ele ensina sem discursos, só com sua presença. Enquanto o Gato se afundava em angústia e arrogância, Perrito estava ali, com um olhar sincero, uma alegria contagiante e desarmada diante da vida. E é ao lado dele, e da Kitty, que o Gato finalmente entende o que talvez sempre ignorou: que o que dá sentido à jornada não é o destino, mas quem caminha com a gente.
É impossível eu não citar aqui uma das minhas frases favoritas do livro Por Quem os Sinos Dobram, de Ernest Hemingway. Em meio à tensão da guerra, dois personagens trocam uma pergunta simples, mas profunda:
— Quem está ao teu lado?
— E isso importa?
— Mais do que a própria guerra.
Essa pequena conversa diz tanto! A vida pode ser dura, o mundo pode estar em ruínas, e os medos às vezes nos tiram o chão. Mas quando temos alguém ao nosso lado, alguém que escuta, que caminha junto, que simplesmente permanece, isso pode valer mais do que qualquer conquista solitária. O Gato começou achando que precisava de mais vidas, mas descobriu que bastava viver bem essa que ele já tinha. No fim da jornada, Perrito olha para o Gato e diz com simplicidade: compartilhar a vida com ele e com a Kitty foi o que tornou tudo especial. E talvez seja exatamente isso. Uma única vida, quando bem vivida e dividida com quem importa, já é o bastante!

Simplesmente fantástico! Fiquei com vontade de assistir o filme. É simples ser feliz, difícil é ser tão simples!